A primeira coisa em que o Brasil precisa ficar de olho é o estreito de Ormuz, entre o golfo Pérsico e o Oceano Índico. Por ali passa 40 % do petróleo consumido no mundo. A segunda coisa é a União Europeia. A terceira é o Oriente Médio e a quarta, as eleições norte-americanas.
Olho vivo e pé ligeiro: isto, como caldo de galinha, nunca fez mal a ninguém.
Há certas coisas em que o Brasil precisa ficar de olho. A nossa direita – na política, na mídia e nos corações e mentes – que fique enterrada no buraco do seu anacronismo. Nós, o Brasil que se preocupa com o futuro do Brasil, precisamos ficar de olho nele.
A primeira coisa em que o Brasil precisa ficar de olho é o estreito de Ormuz, entre o golfo Pérsico e o Oceano Índico. Por ali passa 40 % do petróleo consumido no mundo. De um lado, está a Arábia Saudita e sua corte de satélites: o Kuwait, os Emirados Árabes, o Qatar, o Bahrain, onde, inclusive, está sediada a 5a. Frota Naval Norte-americana, e o Comando Naval dos Estados Unidos para a região, incluindo o Oceano Índico.
Aparentemente, a primeira preocupação dos Estados Unidos em relação ao Irã seria Israel, por causa da eleição futura do presidente norte-americano. Mais ou menos. Isso é importante, sem dúvida. Mas o mais importante é o estreito do Ormuz. Se o Irã concretizasse a ameaça de fechá-lo – até de estreitá-lo mais ainda – a economia mundial viria abaixo, e com ela o “mando” (há quem diga “governança”) Ocidental, pelo menos momentaneamente.
O estreito de Ormuz é, hoje, o ícone de um possível agravamento da recessão mundial – o que seria conseqüência de uma guerra na região. Em parte, essaa recessão teria conseqüências imprevisíveis. Mas as previsíveis seriam piores: guerras militares e econômicas, protecionismos, arrogância ocidental, reforço de Netanyahu, inflação aqui, deflação ali. Com o estreito de Ormuz entra na ordem de preocupações o novo mapa da Liga Árabe. O fator mais preocupante ali é a tentativa saudita de redefinir em torno de si a hegemonia que o Egito perdeu. De longe, a monarquia da Arábia Saudita representa o que de mais reacionário há na região, junto com o governo de Netanyahu. E os Estados Unidos, diante do desafio iraniano, parecem decididos a fortificá-la mais ainda.
A segunda coisa é a União Europeia. Por quê? Porque nada de novo vai acontecer, pelo menos no nível da previsibilidade. Vão continuar as políticas de “austeridade”, que o Premio Nobel Paul Krugman rotula adequadamente de “selvagem”, esse neopopulismo de classe média e de direita facilmente vendável eleitoralmente numa região onde muita gente se considera ameaçada pela emergência do terceiro mundo – fora de sua casa e dentro dela, com a massa de imigrantes e de islâmicos, em particular.
Pode ser que a talvez possível (olhem a quantidade de condicionantes) eleição de François Hollande no lugar de Nicolas Sarkozy na França venha a ocorrer. Mas o que isso significará? Quase certamente muito pouco, a julgar pelo comprometimento dos partidos socialistas e social-democratas europeus com o ideário do conservador Consenso de Bruxelas, com os valores neoliberais e com a OTAN. Mas enfim, como dizia a fábula de Chapeuzinho nas versões dos anos cinqüenta, “não chores, porém, criança, nem tudo está perdido, quando resta uma esperança”. A Europa vai continuar a ser um peso recessivo em 2012.
A terceira coisa é o Oriente Médio. Há uma tentativa de se retomar o (improvável) diálogo entre o governo israelense, perdido ou cegamente clarividente em seu populismo de direita, e a Autoridade Palestina, corretamente empenhada em ampliar seu leque diplomático. É quase impossível que isso ocorra, mas qualquer alternativa em direção à paz é almejável que se realize. O pior que pode acontecer ali, fechando o círculo com o estreito de Ormuz, é o governo de Netanyahu decidir atacar militarmente o Irã, o que mergulharia o mundo num pesadelo. E isso pode acontecer porque ele (esse governo) e ele (Netanyahu) podem muito bem crer que um gesto desses ajudaria os candidatos republicanos nos EUA.
Bom, no plano internacional, chegamos ao fim da linha. Ou ao começo. Refiro-me às eleições norte-americanas. O pior nesse particular (ou “universal”) será a eleição de um dos candidatos republicanos – qualquer um deles. Bem sei que os meus saudáveis e bem vindos críticos ficam furiosos com o que pensam ser meus “elogios” ao contraditório e enrolado Obama; mas se pensam que naquele país “tudo é igual” em termos de política institucional, esperem para ver. A eleição de um republicano nessa altura vai significar um tal retrocesso na política mundial que o mundo que enfrentamos hoje vai parecer brincadeira de criança.
Quanto a isso, o que o Brasil pode fazer?
Rezar, talvez. Até porque nisso a gente é forte.
Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.