Diagnóstico veio após autor ter publicado 3 obras e vencido 2 concursos.
Cristiano Camargo diz que força de vontade o fez superar as dificuldades.
Livro “Autista com muito orgulho – a síndrome vista pelo lado de dentro” conta a história do autor
O choque inicial de descobrir ser asperger transformou-se em inspiração para o livro mais recente, publicado no ano passado. “Autista com muito orgulho – a síndrome vista pelo lado de dentro” é a primeira obra de não ficção de Camargo, que relata um pouco de sua história e o que se passa na vida do autista. A publicação e o trabalho de ativismo na defesa de pessoas com a síndrome renderam ao autor neste ano o prêmio do Movimento do Orgulho Autista, entregue na Assembleia Legislativa de Brasília (DF), onde ele compôs a mesa de debates e discursou no evento.
A descoberta
“Eu considero uma benção ter sido diagnosticado tarde. Sem saber, eu fui superando sozinho, quando eu fui diagnosticado já tinha superado praticamente tudo”, relata Camargo.
Foi durante uma viagem internacional que o pai de Camargo, na época um pesquisador de Farmacologia e Bioquímica da USP, desconfiou que o filho, então com 41 anos, poderia ser autista. Ao ler o livro “O estranho caso do cachorro morto”, de Mark Haddon, em que o protagonista apresentava o distúrbio, o pai notou a semelhança da personagem com o filho. O pesquisador passou o livro a Camargo e marcou uma consulta em São Paulo com um psiquiatra. O médico realizou o exame e confirmou o diagnóstico de asperger.
O transtorno asperger não atinge a capacidade de aprendizado, mas prejudica a interação social e o comportamento do portador. Para explicar como o autista vê o mundo, Cristiano Camargo criou a hipótese que nomeou de “processo de amadurecimento asperger”, no qual o portador vai evoluindo e se tornando mais sociável e independente. O caminho para isso passa por três fases.
Na primeira fase, Camargo explica sob a ótica de sua vida, que a criança cria o “mundo interno de fantasia”, onde inventa suas histórias e interage dentro de si com um imaginário que comanda. A segunda etapa é nomeada pelo autor de “a fase dos dois infernos” quando o contato com a realidade e a confusão com o que é fantasiado geram uma perturbação mental e faz com que a pessoa tenha uma visão desvalorizada de si. “Na cabeça do autista imaturo a realidade é um inferno porque ela não corresponde ao que ele vê no mundo de fantasia interno dele, onde ele mesmo cria as regras, seus personagens e rege tudo isso como se fosse um maestro e tem poder de vida e morte.”
É nesse momento que, segundo ele, o asperger enfrenta o maior desafio: interagir com o mundo real. “Se a pessoa decide começar a visitar a realidade, como a maioria das crianças autistas fazem, ela vai começar a interagir na realidade, a entender, mas é uma época de muito conflito em que ela é obrigada a se virar e dominar esse conflito entre a realidade e a fantasia e distinguir uma da outra”, explica.“Eu considero uma benção ter sido diagnosticado tarde. Sem saber, eu fui superando sozinho, quando eu fui diagnosticado já tinha superado praticamente tudo”, relata Camargo.
Foi durante uma viagem internacional que o pai de Camargo, na época um pesquisador de Farmacologia e Bioquímica da USP, desconfiou que o filho, então com 41 anos, poderia ser autista. Ao ler o livro “O estranho caso do cachorro morto”, de Mark Haddon, em que o protagonista apresentava o distúrbio, o pai notou a semelhança da personagem com o filho. O pesquisador passou o livro a Camargo e marcou uma consulta em São Paulo com um psiquiatra. O médico realizou o exame e confirmou o diagnóstico de asperger.
O transtorno asperger não atinge a capacidade de aprendizado, mas prejudica a interação social e o comportamento do portador. Para explicar como o autista vê o mundo, Cristiano Camargo criou a hipótese que nomeou de “processo de amadurecimento asperger”, no qual o portador vai evoluindo e se tornando mais sociável e independente. O caminho para isso passa por três fases.
Na primeira fase, Camargo explica sob a ótica de sua vida, que a criança cria o “mundo interno de fantasia”, onde inventa suas histórias e interage dentro de si com um imaginário que comanda. A segunda etapa é nomeada pelo autor de “a fase dos dois infernos” quando o contato com a realidade e a confusão com o que é fantasiado geram uma perturbação mental e faz com que a pessoa tenha uma visão desvalorizada de si. “Na cabeça do autista imaturo a realidade é um inferno porque ela não corresponde ao que ele vê no mundo de fantasia interno dele, onde ele mesmo cria as regras, seus personagens e rege tudo isso como se fosse um maestro e tem poder de vida e morte.”
O último estágio é o “Amadurecimento”, quando o asperger se torna produtivo e independente e consegue conviver com a sociedade. “Ela aprende a usar o mundo interno de fantasia como uma ferramenta para se dar bem na vida através da criatividade, para buscar novas soluções para os problemas”, conclui.
Ser asperger ajudou a criatividade
Saber visitar esse mundo interno de fantasias e retratá-lo em textos foi um trunfo que Camargo aprendeu a usar desde cedo. Na escola, vibrava quando os professores passavam redações. Leitor assíduo, começou com o “Livro da Selva”, de Rudyard Kipling, passou por obras Monteiro Lobato, Jack London e clássicos da literatura infantil. Junto com o gosto pela leitura veio a vontade de escrever.
“Quando criança eu adorava as redações, principalmente tema livre. Foi fazendo redações do mesmo tema, juntando tudo e formando uma coleção delas que eu fiz o meu primeiro livro.”
A história “Inesperado Salvador” foi escrita a mão por ele aos 12 anos. Uma amiga da família datilografou os manuscritos e enviou para o concurso Círculo do Livro. O prêmio veio com a publicação da obra em uma coletânea em 1979.
O resultado surpreendeu a família. “Meu pai ficou muito surpreso, de ver a qualidade da história. Era a primeira vez que eu estava escrevendo, então ele não tinha ideia de que eu tinha essa vocação literária.”
Depois veio a obra “Jornada ao Vale Deslumbrante”, publicada em 1989. “Mistério do Grande Urso”, de 1997, lhe rendeu no mesmo ano o prêmio de publicação na coletânea “Melhores escritores de São Paulo”. Com “Automato e outras histórias”, de 2005, Camargo conquistou menções honrosas e o primeiro lugar na categoria livro do prêmio Arthur Bispo do Rosário, em 2009.
“Acredito que isso [ser portador da síndrome] acrescenta uma sensibilidade maior aos textos. As pessoas autistas têm uma ferramenta muito importante, que é o mundo interno de fantasias. Autistas e as outras pessoas utilizam o mundo interno de fantasias de maneiras diferentes”, afirma Camargo. Saber visitar esse mundo interno de fantasias e retratá-lo em textos foi um trunfo que Camargo aprendeu a usar desde cedo. Na escola, vibrava quando os professores passavam redações. Leitor assíduo, começou com o “Livro da Selva”, de Rudyard Kipling, passou por obras Monteiro Lobato, Jack London e clássicos da literatura infantil. Junto com o gosto pela leitura veio a vontade de escrever.
“Quando criança eu adorava as redações, principalmente tema livre. Foi fazendo redações do mesmo tema, juntando tudo e formando uma coleção delas que eu fiz o meu primeiro livro.”
A história “Inesperado Salvador” foi escrita a mão por ele aos 12 anos. Uma amiga da família datilografou os manuscritos e enviou para o concurso Círculo do Livro. O prêmio veio com a publicação da obra em uma coletânea em 1979.
O resultado surpreendeu a família. “Meu pai ficou muito surpreso, de ver a qualidade da história. Era a primeira vez que eu estava escrevendo, então ele não tinha ideia de que eu tinha essa vocação literária.”
Depois veio a obra “Jornada ao Vale Deslumbrante”, publicada em 1989. “Mistério do Grande Urso”, de 1997, lhe rendeu no mesmo ano o prêmio de publicação na coletânea “Melhores escritores de São Paulo”. Com “Automato e outras histórias”, de 2005, Camargo conquistou menções honrosas e o primeiro lugar na categoria livro do prêmio Arthur Bispo do Rosário, em 2009.
Um fator importante para o desenvolvimento, Camargo adere ao apoio dos pais, principalmente após o diagnóstico, mas ele lamenta que muitos autistas não tenham esse suporte. Ele afirma que é fundamental os familiares, pedagogos e terapeutas trabalharem juntos para tornar a pessoa com o transtorno mais rapidamente inserida na comunidade e independente.
“Muitos pais e mães quando recebem a notícia ficam achando que isso é um tipo de sentença de morte social, isso não é verdade. Eu sempre digo, o autismo e a asperger são progressões alternativas globais do desenvolvimento. A asperger faz parte desse gradiente que vai do mais fraco ao mais severo, ela progride positivamente, para melhor durante toda a vida do indivíduo para que ele supere, se torne produtivo, sociável.”
Sonhos, planos e frustrações
Hoje escritor, Camargo chegou a cursar três faculdades, mas não terminou nenhuma. Foi aprovado em estatística na UFSCar, e fez biologia e tradução de inglês em uma faculdade particular de Ribeirão Preto. O gosto por línguas – ele fala inglês e tem noções de francês e italiano – veio de quando morou nos Estados Unidos, de 1979 a 1981, e de 1998 a 1999.
Ele se orgulha de dirigir diariamente seu carro vermelho por Ribeirão e está animado com as negociações para publicar quatro livros até o meio do ano que vêm. Para este ano, a fábula infanto-juvenil de conscientização ecológica “Homem mau, Lobo bom” já está programada. Esta é apenas uma das 165 histórias de autoria dele que estão prontas e aguardando apenas por uma editora interessada.
A única frustração que sente é a de não ser pai. Camargo é divorciado e não teve filhos com a ex-mulher no casamento que durou cinco anos. O escritor diz que seu maior sonho é adotar uma garotinha. Para quem acha que a asperger pode ser uma barreira, ele já tem a resposta.
“O asperger e o autismo não são doenças, a verdadeira doença é o preconceito, a intolerância, a discriminação, a segregação social”, finaliza.
Hoje escritor, Camargo chegou a cursar três faculdades, mas não terminou nenhuma. Foi aprovado em estatística na UFSCar, e fez biologia e tradução de inglês em uma faculdade particular de Ribeirão Preto. O gosto por línguas – ele fala inglês e tem noções de francês e italiano – veio de quando morou nos Estados Unidos, de 1979 a 1981, e de 1998 a 1999.
Ele se orgulha de dirigir diariamente seu carro vermelho por Ribeirão e está animado com as negociações para publicar quatro livros até o meio do ano que vêm. Para este ano, a fábula infanto-juvenil de conscientização ecológica “Homem mau, Lobo bom” já está programada. Esta é apenas uma das 165 histórias de autoria dele que estão prontas e aguardando apenas por uma editora interessada.
A única frustração que sente é a de não ser pai. Camargo é divorciado e não teve filhos com a ex-mulher no casamento que durou cinco anos. O escritor diz que seu maior sonho é adotar uma garotinha. Para quem acha que a asperger pode ser uma barreira, ele já tem a resposta.
“O asperger e o autismo não são doenças, a verdadeira doença é o preconceito, a intolerância, a discriminação, a segregação social”, finaliza.
Matéria e fotos do Do G1
Defesa de pessoas com a síndrome rendeu ao autor o prêmio do Movimento do Orgulho Autista
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